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A FRITURA ANÔNIMA DOS TRÓPICOS

 

As altas temperaturas afetam a agricultura, comprometem o desenvolvimento dos cereais, queimam plantas, causam sofrimento aos animais e influenciam negativamente o humor da sociedade devido à perda de sono. Proteger as florestas deve ser a missão ecológica do Brasil, país que abriga as maiores massas de vegetação tropical e a maior biodiversidade do planeta


Carlos Bocuhy

14 de julho de 2025

As ondas de calor sempre foram desastres anônimos. Diferente dos furacões, o calor extremo sequer tem nome. Parte dos climatologistas europeus, com uma dose de humor negro, referira-se às ondas de calor dos últimos anos como Caronte e Cérbero, respectivamente o barqueiro dos mortos e o cão que guarda a entrada do inferno, da Divina Comédia, de Dante Alighieri. 

Kathy Baughman McLeod, diretora do Centro de Resiliência da Fundação Adrienne Arsht-Rockefeller, afirma que nomear e categorizar ondas de calor com base em sua gravidade aumentariam a conscientização sobre os perigos do calor extremo: “O calor, por ser silencioso e invisível, não tem a natureza telegênica desses outros grandes riscos climáticos, como inundações, furacões e incêndios. Por isso está matando mais pessoas do que qualquer outro perigo climático. Precisa de relações públicas e branding“, disse ela. 

No Oceano Atlântico, cerca de 20 tempestades tropicais, em média, são nominadas a cada ano. Em 2022, uma equipe da prefeitura de Sevilha, Espanha, testou a ideia de batizar a onda de calor de Zoe. De acordo com um artigo que a equipe publicou no ano passado, 6% dos residentes pesquisados que conseguiam lembrar o nome disseram que se envolveram em mais comportamentos de segurança contra o calor. 

A França acaba de experimentar seu segundo mês mais quente de junho, marcado por secas e uma onda ainda anônima de calor. As altas temperaturas alteram a agricultura, prejudicam o desenvolvimento dos cereais, queimam plantas, causam sofrimento para os animais e mudam o humor da sociedade com a perda de sono. 

Um estudo publicado em março na revista Nature, traz dados da pesquisa de uma equipe de chineses que estudou o sono de 214.445 participantes durante dois anos, para entender a influência da temperatura média diária no sono. Constataram que quando a temperatura sobe 10ºC a duração do sono durante uma noite diminui em 9,67 minutos, especialmente o sono profundo. 

O sono e a temperatura estão intimamente ligados porque ”os neurônios que regulam a temperatura corporal estão localizados no mesmo lugar que aqueles que iniciam o sono”, explica Armelle Rancillac, pesquisadora do Collège de France. É no hipotálamo, uma pequena região do cérebro do tamanho de uma amêndoa, que muitas funções reguladoras são desempenhadas por meio da produção de neurotransmissores e hormônios. ”Durante uma onda de calor, o corpo monta um sistema de despertar para não subir muito de temperatura; é por isso que vamos ter um sono mais fragmentado“, afirma Rancillac. 

Em Paris, os típicos telhados com declividade para suportar neve permitem pé direito elevado e habitação dos sótãos. Normalmente, esses espaços são usados por empregadas domésticas ou locados para estudantes e jovens profissionais, mas agora estão se tornando verdadeiras torradeiras. A diferença entre a temperatura na entrada de um edifício e seu sótão pode chegar a mais 10 graus, tornando esses espaços inabitáveis. 

Os telhados parisienses são frequentemente revestidos com zinco, um material apreciado por sua durabilidade e fácil instalação, mas que armazena e libera calor fortemente. De acordo com um estudo do Atelier parisiend’urbanisme, publicado em outubro de 2022, 78% dos telhados parisienses são recobertos com esse metal.

Imagem representando alta temperatura: um panorama de vários prédios sob uma luz laranja do sol
Crédito: rawpixel
Ao sul da Europa, o Mar Mediterrâneo está se revestindo de característica equatoriais, sofrendo, além do aumento de calor, as fortes influências do Sahara. Os furacões são mais constantes, agora chamados de Medicane (paródia de Hurricane), como os que se abateram sobre a Espanha e a Líbia nos últimos anos, ceifando milhares de vidas.  

O desequilíbrio provocado pelo calor extremo, decorrente do agravamento da mudança climática, seja para os ecossistemas naturais ou áreas urbanizadas, ainda não foi devidamente dimensionado e previsto em políticas públicas, seja na América, África, Eurásia ou Oceania.

Exemplo disso foi a nova e intensa seca que surgiu na América do Sul, provocando uma devastação sem precedentes. Aumentou seu perímetro em 2024, potencializada pelo El Ninõ (este sim tem nome), provocando incêndios devastadores no Chile, secando rios no norte do Peru, Colômbia, Venezuela e na Amazônia central. 

Isso desguarneceu as populações que dependiam de transporte e suprimentos por via fluvial. No Brasil o fogo devorou 30 milhões de hectares, uma área maior que a da Itália. 

A seca de 2024, com falta de chuvas, baixa umidade do solo e redução das águas subterrâneas, amplificou incêndios, que se espalharam rapidamente por amplas regiões. O fogo encontrou combustível fácil na vegetação seca, na baixa umidade do ar e com o calor extremo. 

A combustão atingia proporções fora de controle. Ao mesmo tempo, o Sul brasileiro se viu devastado por inundações, quando a umidade continental proveniente dos rios voadores da Amazônia se precipitou de forma concentrada, premida pela barreira da ilha de calor e seca que castigava o interior do continente. 

Tanto a seca extrema do Norte, quanto o dilúvio no Sul, em 2024, merecia ter sido antecipados e nominados.

Proporções de dilúvio ocorreram novamente no Rio Grande do Sul – e surpreendentemente no semiárido Texas. Nos últimos anos choveu no Sahara e os Emirados Árabes Unidos foram palco de fortes inundações. Maior temperatura, mais calor extremo, mais evaporação, mais seca, mais chuva intensa, mais intempestividade. Assim, seguimos, rumo aos impactos inominados dos extremos. 

A COP30 que se realizará em Belém do Pará visa combater esses extremos do desequilíbrio causado pelo aquecimento global. Este tem nome. Também tem nome as grandes corporações petrolíferas e de combustíveis fósseis que provocam mais e mais o aquecimento planetário. 

O Brasil tem nome de árvore. Está dando identidade à COP30 com a figura do Curupira, aquele ser mítico protetor das árvores e dos animais que se transforma em fogo para combater degradadores da floresta – e que tem pés voltados para trás para despistar inimigos. 

Proteger as florestas é a missão ecológica do Brasil, detentor das maiores massas arbóreas tropicais e de biodiversidade do planeta. Sua maior floresta, a Amazônica, está na mira do aquecimento global. Com mais de dois graus de temperatura média global a Amazônia tenderá a fenecer.

Na COP30, o Brasil como o Curupira, terá a missão de combater a degradação que incinera nossas florestas e as expansões globais dos combustíveis fósseis cujas consequências, muitas delas inominadas, se abatem, mais e mais, sobre a sociedade humana.

Carlos Bocuhy é presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam).
 

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