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OS PETROESTADOS E AS CONFERÊNCIAS CLIMÁTICAS

 


Publicado em CartaCapital

Por Carlos Bocuhy

O Brasil sofreu com três eventos climáticos por dia em 2023. Foram 132 vidas perdidas, 9.200 feridos, 74 mil desabrigados e meio milhão de desalojados, segundo o informe do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, o Cemadem.

É preciso refletir sobre a solução do gravíssimo problema climático que vem assolando o planeta. A principal causa é a queima de combustíveis fósseis. Mas o destino climático, discutido em cúpulas globais da ONU, continua nas mãos do petróleo.

A COP29, Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que ocorrerá no Azerbaijão neste ano, será coordenada por mais um chefão da indústria petrolífera, Mukhtar Babayev, que durante 16 anos foi diretor da Companhia Estatal de Petróleo da República do Azerbaijão.

É incompreensível que a ONU, responsável pela realização das cúpulas globais climáticas, permaneça silente diante de seguidos conflitos de interesse. Depois da COP27 do Egito, com forte inclinação para a indústria do petróleo, sobreveio a COP28 de Dubai, nos Emirados Árabes, coordenada pelo Sultão Al Jaber, executivo da Adnoc, empresa estatal de petróleo. A atual indicação do Azerbaijão para sediar a COP29 em 2024 mostra que essa tendência não é fato isolado e que poderá ser a gota d’água.

Collin Rees, da Oil Change International, declarou à AFP que a indicação de Mukhtar Babayev para a coordenação da COP29 “nos empurra para mais perto do abismo”. A escolha do Azerbaijão decorre de um imbróglio político, após a Rússia ter se recusado a aceitar a indicação da Bulgária, pertencente à União Europeia, que se opõe fortemente à invasão soviética da Ucrânia.

A ausência de paz determinou a escolha do Azerbaijão, demonstrando o quanto a geopolítica global é irracional no cenário e instabilidade das guerras. A ação de Moscou acabou novamente atendendo interesses lobísticos do petróleo e do gás, que respondem por 90% das exportações e metade do PIB do Azerbaijão e vive em situação similar à da Rússia, baseando seu crescimento na economia do petróleo e do gás.

Um estado de consternação vem se instalando entre ativistas e especialistas climáticos diante de seguidas indicações conflituosas para países-sede, exatamente no período em que o planeta atravessa aguda fase de emergência climática, prestes a ultrapassar o limite de segurança de + 1,5ºC acordado na Conferência de Paris.

Dominic Eagleton, ativista sênior da Global Witness, disse: “À medida que caminhamos para o colapso climático, agora estamos sendo solicitados a colocar nosso futuro nas mãos do Azerbaijão, um petroestado que é sustentado por grandes petroleiras e está aumentando maciçamente sua produção de gás. Precisamos que a formulação de políticas climáticas seja conduzida por líderes climáticos, não por países com interesse em manter o mundo viciado em petróleo e gás.”

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Mukhtar Babayev tentará se esquivar do conflito de interesses, alegando que, no momento, chefia a pasta de meio ambiente do país. Mas o fato é que ele sempre foi um quadro da indústria do petróleo — e o Azerbaijão apresenta características nada democráticas, com predomínio político dos combustíveis fósseis sobre outras áreas estatais.

Especialistas em democracia e transparência sofrem duras restrições no Azerbaijão. Gudab Ibadogihlu, professor da London Scholl of Economics e pesquisador da Transparência da Indústria Extrativa, continua preso por pedir maior transparência na indústria do petróleo. Sua filha, Zala Bayaramova, afirmou que a indicação do Azerbaijão para sediar a COP29 servirá de cortina de fumaça para acobertar a política petrolífera sem transparência do país.

A prisão política de Ibadogihlu gerou pedidos de libertação do Departamento de Estado dos EUA e da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa.

A realização de seguidas conferências climáticas em petroestados, países pouco democráticos e com péssimo histórico na área de direitos humanos como Egito, Emirados Árabes e Azerbaijão, vem comprometendo o principal elemento de transformação e controle social: a participação popular. Nestes países, a repressão política tem perseguido e calado vozes dissidentes. No Azerbaijão, por exemplo, não existe liberdade de imprensa. O país possui uma série de leis que impedem ONGs de operar livremente, sendo que a detenção por este motivo inclui tortura brutal.

Na COP28 de Dubai marcaram presença milhares de lobistas do petróleo. Além desses, estiveram presentes também lobistas do agronegócio e da pecuária. O clima do COP28 aparentou ser mais de buscar espaços para oportunidade de negócios do que usar o evento para potencializar soluções para a crise climática.

Segundo informou o jornal britânico The Guardian, o Azebaijão “aumentará sua produção anual de gás em cerca de 12 bilhões de metros cúbicos (bcm) nos próximos 10 anos, o que é considerado um período crucial em que os líderes globais devem cortar a produção de combustíveis fósseis se quiserem limitar o aquecimento global. O Azerbaijão possui um dos maiores campos de gás do mundo, Shah Deniz, no Mar Cáspio, e o país deve extrair 411 bcm de gás nos próximos 10 anos, de acordo com dados fornecidos pelo grupo de campanha Global Witness a analistas da Rystad Energy. Isso emitiria 781 milhões de toneladas de dióxido de carbono – mais de duas vezes as emissões anuais de carbono do Reino Unido”.

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Como discutir o futuro da humanidade em países autoritários e umbilicalmente ligados ao petróleo? Como discutir caminhos para a sustentabilidade debaixo de fortíssimo controle político e lobístico?

Não haverá saída para a humanidade se as conferências climáticas não se estruturarem em patamares de democracia, livre de manipulações lobísticas. Da forma em que estão se dando as conferências climáticas, sua organização, os espaços de manifestação para reivindicações da sociedade civil, o controle da agenda e a proposta de textos alternativos para resoluções finais estão ficando na mão dos petroestados. Essa minoria econômica, de países onde a riqueza fóssil apresenta conjunção interna oligárquica, segue ampliando sua principal atividade que está destruindo, em ritmo acelerado e cumulativo, as condições vitais do planeta.

O Brasil recepcionará o mundo na COP30 de Belém, em 2025. A governança climática começa a decepcionar, já que discursos desenvolvimentistas estão se sobrepondo ao discurso ambiental. Estima-se aumento recorde de extração e exportação de petróleo no Brasil nos próximos anos, o que poderá levar o País em pouco tempo do 8º para o 4º lugar mundial em produção.

O discurso ambiental do Brasil poderá se esvair em carbono. O Brasil precisa rever seus caminhos climáticos e buscar de novo a liderança ambiental global que exerceu na Rio-92.

Enquanto o Brasil sofre consequências climáticas fortes, mas tem sua política interna dividida por ambições econômicas insustentáveis, há cenários que devem ser observados em outros países. O terceiro Plano Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas da França está em sintonia com os cenários dos cientistas, levando em consideração o atual estado de políticas de mitigação de gases efeito estufa. Está sendo elaborado com expectativa para enfrentar + 4ºC até 2100. Será em breve submetido ao governo, inclui um verdadeiro arsenal de instrumentos normativos e será aberto para consulta pública no próximo verão.

Não há tempo a perder. A ONU precisa fazer a lição de casa, garantindo que os espaços de discussão climática sejam isentos. A humanidade tem que trilhar caminhos fora da influência dos petroestados que retardam as boas decisões. É preciso garantir as condições basilares para isenção decisória, sem conflitos de interesse, de forma democrática. Só assim a humanidade poderá trilhar, com liberdade, caminhos adequados para equacionar o grave quadro da emergência climática.
 

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