Prejuízos da extração de petróleo na foz do Amazonas
28 Out 2025


Carlos Bocuhy – Vivemos a era dos retrocessos humanitários. É preciso sair da atual realidade limitadora de avanços civilizatórios. Será necessário um esforço adicional da sociedade humana para superar o desequilíbrio multifacetado do “backlash” planetário (involução na proteção ambiental), com bloqueios negativos e retrocessos que podem ser sentidos nas áreas do conhecimento, instâncias de governança ou na piora dos conflitos armados que permeiam a humanidade.
Enquanto o setor de direitos humanos de Genebra se demonstra incompreensivelmente silente em relação à situação atroz e evidente de inanição das crianças na faixa de Gaza, situações mais sutis ganham fortes proporções, como o desmantelamento de sistemas educacionais ligados à área de humanidades, como vem ocorrendo nos Estados Unidos.
O espírito de embate em defesa do conhecimento toma corpo dentro do meio acadêmico norte-americano, como na Universidade de Chicago, onde já ensinaram expoentes como Hannah Arendt, que já vaticinou que a “humanidade” não é mais, em nossos tempos, conceito norteador, mas sim realidade premente.
“Não se pode parar de produzir pessoas treinadas ou educadas para ajudar os alunos de graduação a entender as coisas mais importantes pensadas, escritas ou pintadas na história humana”, afirma o renomado filósofo Robert Pippin, do Comitê de Pensamento Social da Universidade Johns Hopkins e da Universidade de Chicago.
De fato! O atual estágio febril da humanidade ganha proporções inimagináveis quando considerada não apenas inação, mas atitudes que claramente agravam os riscos climáticos globais. Donald Trump ordenou que as agências governamentais identifiquem maneiras de aumentar a produção de petróleo e gás dos EUA, argumentando que administrações anteriores reduziram desnecessariamente a perfuração para combater as mudanças climáticas – e revogou os esforços do ex-presidente Joe Biden para bloquear a perfuração de petróleo no Ártico e ao longo de grandes áreas nas costas do Atlântico e do Pacífico dos EUA.
A influência da extrema direita populista, cujo projeto político se baseia na negação dos riscos climáticos e na sua minimização, vem provocando mudanças nos partidos conservadores na União Europeia e nos Estados Unidos. “Na Europa, o Green Deal está sob ataque, e do outro lado do Atlântico o Departamento de Energia dos EUA publicou uma teia de mentiras sobre as mudanças climáticas neste verão para justificar sua política de desregulamentação ambiental e para não ser mais forçado a reduzir as emissões de gases de efeito estufa”, afirma Valérie Masson-Delmotte, do Conselho Superior do Clima da França.
As defesas do humanismo trazem claramente o apelo de preservar o conhecimento, salvaguardar o aprendizado diante das ameaças do mercado e dos apelos grosseiros do utilitarismo imediatista econômico, que tem seu melhor exemplo na onda trumpiana ecocética que agrava o aquecimento global, abala relações internacionais e ameaça áreas mais progressistas do conhecimento, dentro ou fora da máquina estatal americana.
Salvaguardar a ciência e as boas iniciativas para proteger a humanidade dos aspectos non sense do imediatismo econômico são fato real, como o caos que se instala na ordem econômica global com as políticas coercitivas de taxações praticadas pelo governo Trump.
As práticas de espoliação imobiliária de Belém, no Pará, onde ocorrerá em novembro a COP30, também são exemplo. Aluguéis exorbitantes estão simplesmente inviabilizando uma das oportunidades globais mais relevantes para a história ambiental do Brasil e do mundo, a conferência climática global, que ocorre em pleno período de agravamento da emergência climática.
Recentemente a maioria dos parlamentares da Câmara Federal do Brasil atacou duramente o sistema de licenciamento ambiental, instrumento importantíssimo para a gestão da sustentabilidade territorial. Isso é ainda mais grave no cenário nacional, onde o planejamento se tornou incipiente diante das forças devastadoras em busca das facilidades econômicas que se abatem sobre o território amazônico, Pantanal e Cerrado, entre outros. É a vívida marca do colonialismo exploratório que a sociedade brasileira ainda não conseguiu conter.
O presidente do Senado brasileiro, David Alcolumbre, parece ter convencido o próprio governo brasileiro de que as normas ambientais do licenciamento podem ser relativizadas para regime especial de avaliação no âmbito governamental, se houver interesse federal considerado estratégico.
Essa classificação sempre foi um grande desafio, pois o conceito de desenvolvimento é confundido muitas vezes com mero crescimento, ou inchaço econômico, sem nenhum componente qualitativo de sustentabilidade. Dessa forma relativizou-se a normativa, lançando-a para um rito especial que restringe o tempo adequado para avaliação de impactos, atropelando aportes da ciência e dos direitos da ampla participação social.
Práticas excludentes, mas bem embaladas, se apresentam como jugo suave voltados ao cenário econômico, como se fossem benefícios à nação. Na realidade acabam por corroer direitos fundamentais da vida e da natureza, sacrificando o presente e o futuro, em troca de benefícios imediatos para a mão de poucos. Isso não é interesse nacional.
Estávamos um pouco distraídos enquanto esses processos se instalavam, afirma Jacques Rancière, filósofo e educador francês: “Não percebemos o movimento pelo qual a lógica capitalista da globalização se tornou a vontade de dominação absoluta dos corpos e mentes, e a busca pela redução de custos convergiu com ideologias identitárias e a paixão por eliminar o indesejável”. Adepto da democracia radical, Rancière afirma que “é difícil adaptarmo-nos a uma época em que se trata mais de resistência do que de invenção”.
Tempos de trincheira e resistência. Mas haverá a oportunidade para avançar, uma vez que este modelo, do ponto de vista ambiental, se esgota por si.
É preciso que a sociedade esteja atenta, uma vez que ainda existem dificuldades cognitivas profundas na espécie humana, causadas pela lógica puramente mercantilista, a tal ponto de permitir, por exemplo, a destruição da própria sustentação hídrica continental para lucrar com a devastação da Amazônia. Nada mais próximo da fábula da galinha dos ovos de ouro.
A COP30 será o grande indicador da capacidade humana de reação ao caos que vem se instalando. A responsabilidade do Brasil ao sediar a conferência é imensa. Além dos acordos em curso, que envolvem metas para redução de emissões e reparação de danos para países vulneráveis, o momento político da COP30 é extremamente oportuno para avaliar a extensão dos impactos da atual era de retrocesso sobre o equilíbrio climático – e propor medidas firmes para sua superação.
Fonte da matéria: Era de retrocessos humanitários e ambientais – ((o))eco – https://oeco.org.br/colunas/era-de-retrocessos-humanitarios-e-ambientais/


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